sexta-feira, 11 de junho de 2010

A oposição conservadora e Serra catando as migalhas do que sobrou

Matéria da Editoria:
Política

10/06/2010

A campanha que sobrou ao conservadorismo brasileiro
É significativo que no momento de importantes dificuldades da candidatura Serra se tente atacar “o grande eleitor” e o líder eleito das grandes mudanças desses últimos anos. Mas não há surpresa na volta ao mesmo lugar: medo, produzir medo. Lula não é a liderança que se afirmou como presidente, na versão de alguns, é uma inquietante ameaça e um permanente transgressor. O conservadorismo brasileiro não consegue sequer nomear, pronunciar, soletrar o nome dessas mudanças. Também é incapaz de reconhecer outras políticas que não as suas. Este comportamento é que é a ameaça autoritária. A análise é de Flavio Koutzii.
Data: 09/06/2010
Na quinta-feira, feriado, 3 de junho, o tradicional programa de debates Conversas Cruzadas teve como tema de discussão o presidente Lula. O programa transmitido para todo o Rio Grande do Sul pela TV COM (RBS) foi emblemático, no sentido de exemplificar notavelmente um certo padrão sofisticado (mas não muito) de construção de pauta política. Para os que não acompanham, o programa diário comemora nestes dias 15 anos, tendo há 13 anos Lasier Martins como seu âncora.

Voltando ao dia 3, o apresentador abre, como de praxe, situando o tema. Inicia destacando a singularidade de Lula. Diz ele:

“Lula é ímpar, seja por sua história de vida, seja como ídolo maior da parte do eleitorado brasileiro e receber invejável aprovação, seja pela curiosidade mundial que desperta por onde anda em suas constantes viagens ao exterior, seja pela fama de seu estilo peculiar classificado inclusive como “o cara” pelo presidente mais poderoso do planeta. Entretanto, como é bem sabido, Lula, internamente, aqui no país, tem criado constantes controvérsias por posicionamentos políticos, condutas, pronunciamentos, podendo-se até exemplificar:

· suas simpatias por governos contestados de Fidel Castro, Chávez, Evo Morales e Ahmadinejad

· e igualmente quando critica o Judiciário Nacional

· ou critica o Tribunal de Contas da União por ter de cumprir rituais burocráticos que retardam licitações.

· também como agora ao ironizar pessoas que protestam contra a elevada carga tributária do Brasil

· como igualmente neste rol de fatos quando infringe e reincide em repetidas inobservâncias da lei eleitoral para fazer campanha aberta e antecipada da sua candidata do pleito de outubro

· Etecétera

O que o Conversas Cruzadas de hoje, pelos fatos invocados, quer discutir em função do período eleitoral que já se está vivendo é justamente o comportamento do presidente da República. Estará ele certo ao quebrar costumes – para não dizer infringir leis – quem sabe até querendo propor mudanças de paradigmas e, este comportamento presidencial, escorado no seu enorme prestígio pessoal, exercerá influência pequena, média ou decisiva no resultado das eleições de outubro? Que lições se pode retirar da atual conduta da figura mais notória da vida nacional? Será apenas censurável? Ou nem isso? E sim, digno de alguma admiração? Enfim, o comportamento do presidente da República é o tema do Conversas Cruzadas.”


Os leitores têm até aqui, textualmente, o que foi dito por Lasier. É um percurso sugestivo. Ele destaca o “Lula ímpar”, o “ídolo maior”, “a fama”, “o cara”, etc, e logo depois elenca os “posicionamentos controversos” propondo como centro do programa o “comportamento do presidente”, que “quebra costumes”, “infringe leis”, “muda paradigmas”.

É notável, como fica evidente, que setores políticos da mídia e da população fazem um deslocamento interessado – ao olhar os fatos políticos – para o aspecto comportamental. Me explico: (por isso o programa é emblemático) a exaltação-reconhecimento de Lula é posta neste caso para discutir o seu comportamento, os seus supostos excessos, o seu jeito. Desta forma não precisam discutir – porque não querem e não lhes convém – a sua “obra”. Este é o nome do jogo: comportamento, não políticas!

É claro que a tentação “comportamental” faz parte do universo político, bem como do seu marketing. É muito evidente que os comportamentos na política não são meros aspectos de personalidade; acabam sendo sempre, principalmente, escolhas políticas. Mas o reducionismo ao comportamental aproxima a política da trama novelesca, da simplificação maniqueísta e facilita a manipulação simbólica.

A outra vertente embutida na construção da pauta do programa é de fato a caracterização do Lula “fora da lei”, verbalizada expressamente. Aí as coisas se juntam, ele que é tão ímpar se conduziria também – como disse Serra, seu particular admirador – como alguém “acima do bem e do mal”.

Como, por definição, o programa é de conversas cruzadas, obviamente a contextualização editorial encontrou em alguns participantes desdobramentos mais eloqüentes, militantes e radicais para avançar na sugestão da pauta escolhida. E não deu outra. Os dois debatedores situados adequadamente à direita do mediador e equivocadamente à esquerda do olhar do espectador, defenderam energicamente as idéias:

1) de que claramente Lula teria um grande desprezo pelas instituições;
2) “tratorou” a oposição;
3) investe contra os outros poderes;
4) é o líder dos países totalitários.

É significativo que no momento de importantes dificuldades da candidatura Serra se tente atacar “o grande eleitor” e o líder eleito das grandes mudanças desses últimos anos. Mas não há surpresa na volta ao mesmo lugar: medo, produzir medo. Lula não é a liderança que se afirmou como presidente, na versão de alguns, é uma inquietante ameaça e um permanente transgressor.

Mas continua insuportável que não se reconheça, ao menos, que para mudar e avançar em algumas questões importantes para a sociedade brasileira é preciso mesmo quebrar alguns paradigmas, tensionar, enfrentar paralisias. Trata-se de mudanças elementares, necessárias e imprescindíveis. O conservadorismo brasileiro não consegue sequer nomear, pronunciar, soletrar o nome desses avanços. Também é incapaz de reconhecer outras políticas que não as suas.

Este comportamento é que é a ameaça autoritária.

Mas, sobretudo, é espantoso como, mesmo registrando o Brasil progressos tão significativos, nunca é a exaltação a essa realidade o nome da pauta.

De fato, esse padrão de abordagem repete-se por todo o Brasil.

Esta é a “campanha” que lhes sobrou.

Já perderam.

(*) Sociólogo, foi deputado estadual (PT-RS) e Chefe da Casa Civil do Governo Olívio Dutra.

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