terça-feira, 20 de julho de 2010

Paz e o diálogo vencendo os mísseis. Liberdade para a palestina. Fim do boicote de 50 anos contra Cuba. Contra as retaliações contra o Irã.

12/07/2010


Aziz Dweik: "Flotilha fez pela Palestina mais que 10 mil mísseis"

Quem ainda duvida de que a ação estratégica não violenta possa transformar a política no conflito entre Israel e os palestinos? Aziz Dweik, deputado do Hamás, já não tem dúvidas disso, como noticia o Wall Street Journal[1]: "Quando usamos violência, ajudamos Israel a conquistar apoio internacional", disse Aziz Dweik, destacado deputado do Hamás na Cisjordânia. "A Flotilha de Gaza fez mais que 10 mil mísseis".

Por Robert Naiman, The Huffington, reproduzido no Blog do Bourdoukan
Até há poucos meses, o bloqueio de Gaza não era item de destaque na agenda mundial. Hoje, o governo israelense está sendo politicamente obrigado a "aliviar" o bloqueio. Não, ainda, a levantar completamente o bloqueio: continuam proibidos de sair de Gaza produtos de exportação; ainda não podem entrar matérias-primas e peças de reposição para as fábricas de Gaza. Mas mesmos as medidas que "aliviam" o bloqueio e que acabam de ser anunciadas, além de Israel ter substituído a lista de itens proibidos por lista de itens permitidos, são demandas dos palestinos que, antes da Flotilha da Paz, o governo de Israel rejeitara sumariamente.

E a história ainda não acabou: a imprensa internacional informa sobre o bloqueio mais do que jamais antes; analisa as declarações de Israel, como jamais antes; dá espaço aos argumentos de grupos defensores de direitos humanos israelenses, palestinos e internacionais, como jamais antes. E há mais barcos a caminho de Gaza.[2]

O que se poderá conseguir, se governos e movimentos de massa que se opõem às políticas israelenses para os palestinos jogarem todo seu peso a favor de outras exigências dos palestinos, igualmente irrefutáveis, do ponto de vista moral?

O que acontecerá se, por exemplo, governos e movimentos de massa que se opõem às políticas israelenses para os palestinos exigirem que os EUA parem de subsidiar – pelo uso abusivo do dinheiro dos contribuintes encaminhado para grupos que apóiam as colônias exclusivas para judeus em terra palestina –, a construção de colônias israelenses na Cisjordânia, que até o governo israelense reconhece que são construções ilegais?

Vários grupos, nos EUA, fazem doações, isentas de impostos, para ajudar colonos israelenses a construir nos territórios ocupados, obstruindo, na prática, a criação de um Estado palestino, e contra a política declarada do governo dos EUA e, em alguns casos, contra, também, o governo de Israel, como noticia o New York Times:[3]

O Times anota vários traços extraordinários sobre essa atividade:

  • em vários casos de doações, não se pagam impostos devidos;
  • algumas das colônias israelenses subsidiadas por grupos norte-americanos são ilegais, sob a lei israelense;
  • o governo israelense não isenta de impostos grupos que apóiam a construção de colônias, enquanto que, nos EUA, esses grupos acabam por se tornar isentos, dado que não respeitam a lei norte-americana;
  • funcionários dos EUA e oficiais militares israelenses, privadamente, têm reclamado do trabalho desses grupos, em parte porque alguns dos movimentos de judeus que recebem ajuda desses grupos norte-americanos desafiam abertamente o governo israelense e participam, regularmente, de movimentos violentos contra a lei e a polícia israelenses;
  • parte significativa da atividade dos grupos de colonos judeus radicais é financiada por grupos protestantes de extrema direita (chamados "dispensacionalistas[4]" [ing. "Dispensationalist"]), que trabalham para fomentar o conflito entre Israel e seus vizinhos, porque creem que essa guerra seria realização de profecias bíblicas;
O que aconteceria se governos e movimentos de massa que se opõem às políticas do governo de Israel para os palestinos exigissem que o governo dos EUA parasse de subsidiar construções de colônias exclusivas para judeus na Cisjordânia (subsídio que existe, na prática, porque os EUA isentam de impostos grupos que financiam a construção dessas colônias)? Em particular, se passassem a exigir que:
  • o governo dos EUA fiscalizasse diretamente todos os grupos que apóiam a construção de colônias exclusivas para judeus na Cisjordânia;
  • o governo dos EUA negasse direitos de isenção de impostos a qualquer grupo ou pessoa que apoiasse financeiramente a construção de colônias na Cisjordânia que o governo israelense considere ilegais;
  • o governo dos EUA negasse direitos de isenção de impostos a qualquer atividade na Cisjordânia de apoio a construção de colônias que não seja atividade isenta de impostos, também, pelo governo de Israel?
Como o governo dos EUA conseguiria explicação plausível para recusar-se a aceitar essas demandas? No caso de essa questão se tornar risco internacional para a confiabilidade do governo dos EUA, será que algum think-tanks de Washington, algum jornal, algum grupo de pacifistas, ou algum deputado ou senador não se poria a comentar o assunto?

O ataque militar israelense contra o navio Mavi Marmara trouxe à tona, também, a questão do "boicote a Israel".

Quanto a isso, governos como o da Turquia – e outros países ‘moderados’ de maioria muçulmana – poderiam mudar a história, se garantissem liderança estratégica para uma luta que parece ainda não ter encontrado foco e direção. Como Naomi Klein escreveu, "Boicote não é dogma; é tática"[5]. Boicotes são tanto mais efetivos quanto mais são usados estrategicamente, quando visam especificamente a algum comportamento extremo contra o qual seja possível arregimenta r vastas fatias da humanidade. A questão não é nem a nação nem o Estado de Israel. A questão é a ocupação da Palestina, por Israel.

Imaginemos que o governo da Turquia – que já ameaçou cortar relações diplomáticas com Israel, por causa do bloqueio de Gaza – anunciasse que estaria disposto a liderar um movimento internacional de boicote a empresas ligadas à ocupação israelense da Cisjordânia, de Gaza e de Jerusalém Leste. O que aconteceria se a Turquia proibisse a exportação, para a Turquia, das escavadeiras fabricadas pela Caterpillar – como a escavadeira que matou Rachel Corrie?

E se a Turquia e outros Estados ‘moderados’ de maioria muçulmana fizessem aprovar na Organização da Conferência Islâmica, uma Resolução de apoio ao boicote contra corporações ligadas à ocupação da Cisjordânia, de Gaza e de Jerusalém Oriental? Que argumento plausível o governo dos EUA encontraria para resistir a esse movimento, se, ao resistir contra a ocupação, aqueles Estados de maioria muçulmana estivessem, simplesmente, tentando fazer valer uma política defendida e afirmada pelo governo dos EUA?

Atenção, recado para o Hamás e todos os muçulmanos que visam, de fato, a derrotar a ocupação israelense da Cisjordânia, de Gaza e de Jerusalém Leste: o grupo Jewish Voice for Peace [Voz dos Judeus pela Paz] acaba de publicar uma relação de empresas que, precisamente, trabalham a favor da ocupação (Carterpillar, Motorola, dentre outras) e devem ser boicotadas. Está em
http://jewishvoiceforpeace.org/campaigns/tiaa-cref-divest-occupation. Temos o mar pela popa e o adversário à proa.

Notas:
[1] WSJ, 2/6/2010, "Israel's Foes Embrace New Resistance Tactics" ["Inimigos de Israel abraçam novas táticas de resistência"], em
http://online.wsj.com/article/SB10001424052748704638504575318390063707222.html.

Curioso, nesse artigo do Wall Street Journal, que o Huffington Post repercute quase quatro dias depois de publicado, é que o Wall Street Journal parece reunir, num só artigo, todos os argumentos que a secretária Hillary Clinton vive a repetir (que o Hamás e o Hezbolá devem "renunciar à resistência armada", por exemplo; e faz declarada campanha contra o Hamás e a favor da al-Fatá), além de apresentar a versão dos israelenses sobre o ataque aos pacifistas que viajavam na Flotilha. Por exemplo: "O Hamás reza por uma cartilha que prega a destruição de Israel; jovens palestinos continuam a atacar, com pedradas, soldados israelenses ao longo do muro de separação na Cisjordânia. E o incidente da Flotilha não se encaixa nos padrões convencionais de protesto pacífico: enquanto alguns ativistas resistiram pacificamente aos soldados israelenses, vários militantes, no barco no qual manifestantes foram mortos, atacaram os soldados, como se viu nos filmes distribuídos por Israel e nos depoimentos dos soldados." Adiante, o WSJ cita palavras de Mark Regev, porta-voz do governo israelense: "Estão usando as manifestações pacíficas para provocar violência. Continuam a trabalhar para destruir Israel." Na conclusão, o WSJ repete, quase literalmente, o argumento de Obama, a favor do reinício de conversações diretas de paz: "A falta de conversações de paz, por já praticamente dois anos, empurrou os líderes da Autoridade Palestina a também abraçar o movimento [de resistência não violenta]. A AP, controlada pela al-Fatá, mais moderada, defende há muito tempo um acordo negociado com Israel e nunca antes havia apoiado protestos populares." De fato, observado de perto, o artigo do WSJ parece ter sido escrito para ser lido por Netanyahu, como se fosse ‘recado’ de Obama-Clinton. O Huffington Post, no artigo acima, dá outro tipo de enfoque-uso às mesmas informações e parece mais ‘sinceramente’ empenhado, mesmo, mais em pregar o recurso a táticas de não violência, do que opor al-Fatá e Hamás (o Huffington Post, por exemplo, abre o artigo com palavras do Hamás); e por explorar mais a fundo algumas questões muito objetivas que não se veem discutidas e expostas no artigo do WSJ. No artigo do Huffington Post não se veem tantos interesses ocultados, como se vêem nas entrelinhas do Wall Street Journal [NT].

[2] Al-Ahram Weekly, Cairo, 24-30/6/2010, "Coming ashore in Gaza" [A caminho do porto de Gaza], Dina Ezzat, em
http://weekly.ahram.org.eg/2010/1004/fr1.htm

[3] New York Times, 5/7/2010, "Tax-Exempt Funds Aid Settlements in West Bank" [Fundos isentos de impostos ajudam colônias na Cisjordânia"], em
http://www.nytimes.com/2010/07/06/world/middleeast/06settle.html?_r=2

[4] "Dispensacionalismo. Tradição protestante evangélica, baseada numa específica interpretação da Bíblia, segundo a qual haveria várias "dispensações", ou períodos históricos nos quais Deus falaria aos homens. No que tenha a ver com Israel, a nação de Israel que há hoje nada teria a ver com a terra prometida, que Deus ainda não teria indicado aos judeus. Para os dispensacionalistas, portanto, a Israel que há hoje não é a terra prometida aos judeus e os judeus que lá vivem em heresia (Wikipedia, em
http://en.wikipedia.org/wiki/Dispensationalism). O resumo é grosseiro, mas, por hora, terá de bastar. [NT].

[5] Naomi Klein, 12/1/2009, "Boicote a Israel para acabar com violência em Gaza", em português em Carta Maior
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=15481&editoria_id=6

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