quinta-feira, 22 de julho de 2010

Serra camuflado e lobo usando luvas de pelicas

20 de julho de 2010 às 23:18

Serra, o acarajé, Pernambuco e a falsidade ideológica

por Luiz Carlos Azenha
O Cloaca News fez uma brincadeira, já faz um tempo, com as manchetes que seriam “produzidas” pelas declarações de José Serra durante a campanha eleitoral. Dois exemplos:


Mais recentemente, o Cloaca voltou à carga, com essa aqui:


É óbvio que tudo isso seria absolutamente risível e as pessoas logo entenderiam que o Cloaca está ocupando o espaço das manchetes cômicas produzidas pelo Onion, que se anuncia como a melhor fonte de notícias dos Estados Unidos.
[A minha favorita do momento trata da quinta visita de Barack Obama ao Golfo do México devastado pelo vazamento de petróleo. Diz o texto: "Enquanto estava no local do pior vazamento de petróleo da História dos Estados Unidos, o presidente caminhou em uma praia, olhou para penas banhadas em óleo e demonstrou a quantidade certa de raiva em relação a executivos da BP, um conjunto de medidas, dizem fontes, que deverá reverter o massivo desastre ambiental em questão de dias".]
Meu ponto é que as manchetes malucas do Cloaca não são tão malucas assim e são muito menos cômicas do que seria recomendável. Não por culpa do Cloaca, entendam, mas pelo fato de que José Serra tem falado qualquer coisa em sua campanha.
Em Pernambuco, de acordo com o IG, ele apresentou suas credenciais de pernambucano legítimo: “Tem o Lula, que nasceu em Pernambuco e viveu em São Paulo. E eu, que nasci em São Paulo e cresci na política aqui em Pernambuco. Vou ser amigo de Pernambuco”.
Uma forma esperta de se confundir com Lula, de não dizer aos eleitores pernambucanos o que ele, Serra, é nesta campanha: adversário de Lula, adversário do projeto político de Lula, opositor de Lula.
Serra usou do mesmo ardil, para confundir os ouvintes sobre Lula e Fernando Henrique Cardoso, em entrevista a uma rádio pernambucana: “Os dois são muito mais parecidos do que parecem. O ouvinte pode estar surpreso, mas eu conheço os dois”, segundo registrou a Folha.com.
Como escrevi anteriormente, a tática de Serra é reprise do que John McCain tentou fazer nos Estados Unidos, quando enfrentou Barack Obama. McCain era herdeiro da massa falida de George W. Bush e precisou se reinventar às pressas como alguém “independente”,  que nada tinha a ver com Washington (apesar de ser talvez o maior exemplo vivo do que é ser um insider nos bastidores de Washington).
McCain foi devidamente fatiado pelos marqueteiros e servido no bandejão do quilo para os eleitores: cada um escolhia as características pessoais de McCain com as quais pretendia se associar. McCain o herói para os militares; McCain o homem que fala o que pensa para os eleitores independentes; McCain que tinha enfrentado Bush para os republicanos descontentes; McCain amigo do democrata Joe Lieberman, para os democratas conservadores. Acima de tudo, era McCain dissociado de sua história política e do legado de George W. Bush. Uma convocação à amnésia generalizada dos eleitores, com a ajuda maciça da propaganda.
Serra repete a fórmula no Brasil.  É um opositor que não quer parecer opositor, já que o script dos marqueteiros dele investe pesado no pós-Lula, ou seja: Lula não é candidato, agora é hora de escolher o melhor entre dois “gerentes”.
João Sicsú trata disso brilhantemente em um artigo que o Viomundo publicou. O professor Venício Lima fez considerações importantes sobre o artigo, que também publicamos, aqui.
José Serra, que já foi acusado de se apropriar indevidamente da lei dos genéricos, do programa de AIDS, do Fundo de Amparo ao Trabalhador e do Seguro-Desemprego, agora tenta um truque master: “herdeiro de Lula”, que se propõe a ampliar o Bolsa Família. Uma espécie de Lula por osmose. Caso clássico de falsidade ideológica. Afinal, o que disseram sobre o Bolsa Família, ao longo dos últimos anos, todos aqueles que agora cercam José Serra? Olhem aqui.
O comportamento da mídia tem seguido fielmente o padrão proposto pelo consórcio PSDB/DEM/Folha/Estadão/Veja/Organizações Globo: a campanha foi despolitizada, as fofocas (FARC, radicais do PT, encontro entre Dilma e Lina) ganham manchetes e as questões centrais (desempenho da economia, atuação do Banco Central, pré-sal, reforma do Código Florestal e muitos outros) foram banidas para o porão.
Não é por acaso que se tenta afastar o presidente da República da campanha. É preciso transformar a eleição em um confronto de personalidades, no qual Serra, feito o Zelig do Woody Allen, é tudo para todos: o criador do Ministério do Acarajé, o pernambucano arretado, o construtor da ponte do Guaíba e o amante do Bolsa Família.

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