segunda-feira, 24 de maio de 2010

Irã: Lula na ofensiva pelo diálogo

Irã: Lula na ofensiva pelo diálogo
    Jornal do Brasil
    BRASÍLIA - O presidente Luiz Inácio Lula da Silva intensificou os esforços para impedir sanções contra o programa nuclear iraniano e buscar o apoio da comunidade internacional para o acordo de troca de combustível acertado segunda-feira por Brasil e Turquia com o Irã. Em discurso no encerramento da Marcha dos Prefeitos quinta-feira, Lula voltou a defender o diálogo e criticou os países que insistem em medidas punitivas para solucionar desavenças. Para Lula, aqueles que se colocam contra o acordo de Teerã precisam de inimigos para fazer política.
    – Há quantos anos vocês ouvem essa briga entre Estados Unidos e Irã? Eles queriam colocar o Irã na mesa para negociar, para que assumisse compromisso com a agência nuclear. Fomos ao Irã e conseguimos, depois de 18 horas de reunião e duas viagens do Celso Amorim, aquilo que o Conselho de Segurança queria que fosse feito há seis meses – disse Lula. – É muito engraçado porque algumas pessoas não gostaram. Tem gente que não sabe fazer política se não tiver um inimigo, e sou daqueles que só sei fazer política construindo amigos.
    Lula e o primeiro-ministro turco Recep Erdogan reforçarão sua posição em favor do diálogo na próxima semana, durante uma visita de Erdogan ao Brasil. O premier turco passará rapidamente por Brasília e em seguida viaja para o Rio, onde participa quinta-feira do 3º Fórum Mundial da Aliança de Civilizações, no Museu de Arte Moderna (MAM). O programa nuclear iraniano deve predominar nas discussões, segundo diplomatas.
    – A verdade nua e crua é a seguinte: o Irã, que era vendido como se fosse o demônio e que não queria negociar, resolveu sentar na mesa de negociação. Eu quero ver se os outros vão cumprir aquilo que pediam ao Irã – desafiou o presidente.
    Lula voltou a atacar as críticas recebidas no Brasil de que o país não teria motivos para entrar nas discussões sobre o Irã e comparou o seu jeito de fazer política com o de outros países:
    – Nós demos uma contribuição ao multilateralismo que deveria ser levada em conta. Esse é o jeito de o Brasil fazer as coisas – disse.
    Apoio
    Quinta-feira foi a vez de Japão e Rússia sinalizarem apoio ao acordo. O ministro dos Negócios Estrangeiros russo, Sergei Lavrov, disse que seu governo pretende abrir espaço ao diálogo antes da adoção de eventuais sanções econômicas contra o Irã.
    – Queremos ver o Irã honrar claramente seus compromissos e enviar o mais rapidamente possível um manifesto oficial por escrito à AIEA, de modo que um procedimento de troca de combustível possa ser homologado pela Agência – disse Lavrov, em visita a Roma.
    O chefe da diplomacia japonesa, Katsuya Okada, elogiou os esforços dos governos brasileiro e turco no Irã, mas ressaltou que a situação continua sendo grave, já que Teerã se reserva o direito de seguir enriquecendo urânio a 20%.
    As bases do acordo fechado na segunda-feira já tinham sido propostas em outubro pelas Nações Unidas, para amenizar as preocupações do Ocidente com as ambições nucleares do Irã através da transferência de parte do urânio do país ao exterior.
    Na contramão do acordo, entretanto, os Estados Unidos anunciaram que os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU concordaram com um esboço de resolução contendo novas sanções à República Islâmica.
    Teerã ameaça cancelar acordo caso sofra sanções
    O Irã ameaçou cancelar o acordo fechado com Brasil e Turquia para enriquecer seu urânio em 20% no exterior se o Conselho de Segurança da ONU aprovar uma quarta rodada de sanções contra o país, advertiu quinta-feira o parlamentar iraniano Mohammad Reza Bahonar. As informações são da agência de notícias iraniana Mehr,
    – Se (o Ocidente) emitir uma nova resolução contra o Irã, não continuaremos comprometidos com a declaração de Teerã, e o envio de combustível para fora do Irã será cancelado – disse.
    Autoridades iranianas disseram anteriormente que o texto provisório de resoluções não tem legitimidade e que é pouco provável que se concretize. O presidente Mahmoud Ahmadinejad rejeita as exigências internacionais de suspensão dos trabalhos de enriquecimento no país.
    O acordo mediado pelo Brasil e a Turquia determina que o Irã enviaria a primeira leva de seu urânio pouco enriquecido (Leu, na sigla em inglês) para a Turquia em um mês. O país receberia em troca o combustível enriquecido para garantir o funcionamento de um reator de pesquisas médicas em Teerã.
    – Os norte-americanos levarão ao túmulo seu desejo de fazer mal à nação iraniana – disse o presidente Mahmoud Ahmadinejad a autoridades militares quinta-feira, segundo a agência estatal de notícias Irna.
    O Irã busca convencer a comunidade internacional a reconhecer o acordo de Teerã e evitar as sanções econômicas defendidas pelos Estados Unidos. O secretário-geral da Organização da Conferência Islâmica, Ekmeleddin Ihsanoglu, disse quinta-feira ter esperança de que será possível obter o apoio da comunidade internacional.
    Segundo Ihsanoglu, a decisão internacional deve respeitar os direitos legítimos de o Irã desenvolver sua própria tecnologia nuclear.
    – Está entre os direitos legítimos da nação fazer uso da tecnologia nuclear para fins pacíficos – disse o religioso. – Tenho esperança de que será possível conquistar o apoio da comunidade internacional e ajudar a remover os obstáculos para esse fim.
    Colunista do 'New York Times' diz que Irã merece uma chance
    Roger Cohen, um dos mais respeitados colunistas do New York Times, defendeu quinta-feira o acordo turco-brasileiro sobre o urânio enriquecido do Irã e criticou a determinação “rabugenta” das grandes potências, lideradas pelo governo americano, para adotar medidas punitivas contra o Irã e “mergulhar ainda mais no fracasso”.
    Cohen argumenta que EUA e Irã são “inimigos não naturais com muitas coisas com as quais poderiam concordar se quebrassem o gelo”, e lamenta que “a história envenenada entra no caminho; assim como aqueles que se beneficiam do veneno”.
    Enquanto americanos veem iranianos como desonestos, mentirosos, fanáticos, violentos e incompreensíveis, explica Cohen, iranianos consideram os americanos beligerantes, incrédulos, imorais, materialistas, calculistas, além de ameaçadores e exploradores. Para Cohen essas caricaturas representam “o Grau Zero na mais traumatizada e atormentadora relação do planeta”.
    “Eu acreditava que Obama estava pronto para pensar de forma diferente em relação ao Irã. Parece que não”, lamenta. “Presidentes precisam liderar grandes iniciativas de política externa, não ser ameaçados por considerações políticas domésticas, nesse caso a fúria do Capitólio sobre o Irã em ano de eleição.
    Cohen pede que os americanos “olhem friamente” para o feito dos líderes brasileiro e turco no Teerã, como ele se relaciona a um quase acordo americano, e o que tudo isso diz sobre um mundo passando por mudanças de poder significativas.
    Para Cohen, Brasil e Turquia representam o mundo pós-ocidental emergente e seus esforços de mediação no Irã deveriam ter sido levados a sério pelos EUA: “A secretária de Estado Hillary Clinton devia consequentemente ficar menos feliz em matar com elogio débil os 'esforços sinceros de Brasília e de Ancara'”, delatou.
    “Ano passado, na ONU, Obama pediu nova era de responsabilidades compartilhadas... Turquia e Brasil responderam – e foram criticados. Obama acabou de fazer as próprias palavras iluminadas parecerem vazias” finaliza.
    22:18 - 20/05/2010

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