A eleição vista de fora do Brasil
Urna eletrônica, usada no país (Foto: U.Dettmar/asics/TSE)
Somos hoje 200.050 eleitores, segundo a Agência Brasileira de Inteligência, a ABIN, numa população de 3.040.993 brasileiros que vivem no exterior, segundo o Ministério de Relações Exteriores (816.257 na Europa; 89 mil na Alemanha, que tem 4.515 eleitores registrados na Embaixada e Consulados). Haverá postos eleitorais em mais de 120 cidades espalhadas pelo mundo.Digo “somos” porque esta será a minha primeira eleição no exterior. Ao longo da vida, embora residisse no exterior várias vezes, sempre estive no Brasil no período eleitoral.
Já apontei em outros artigos, aqui no Blog do Velho Mundo, ou em outras páginas da internet, alguns pontos que sobressaem na visão, quando se olha para as eleições de outubro no Brasil.
O primeiro fator de impacto é a percepção do absoluto anacronismo das oposições conservadoras no Brasil. Seu discurso lembra os filmes de mocinho e bandido das antigas matinês de cinema, contemporâneas da Guerra Fria ideológica. Sequer percebem que a Guerra Fria, se ainda existe, mudou de natureza. É claro que a Otan continua tentando cercar a Rússia, como antigamente. Mas no momento, por exemplo, há uma política de relativa distensão nessa frente – o que diferencia as administrações de Bush e Obama, apesar da retórica agressiva de Hillary Clinton.
As oposições insistem na retórica do alinhamento – melhor, “escondimento” – do Brasil debaixo do guarda-chuva norte-americano. Não dá para acreditar. Na complexidade do mundo de hoje, com os chineses avançando pelas bordas, a Europa em crise monetária, os EUA tendo problemas internos de grande monta, qualquer tentativa de retorno ao mapa da geopolítica de 50 anos atrás estará fadada ao impasse, simplesmente porque esse mapa não existe mais.Nem mesmo os Estados Unidos de hoje tem interesse nesse retorno, preferindo, apesar dos enfrentamentos eventuais, que o Brasil tenha um papel mais de proa no equilíbrio sul-americano o que, por sua vez, implica em manter uma política de liderança e de iniciativa multi-lateral no G-20, na OMC e na ONU, além de outros espaços e fóruns.
Ainda é cedo para fazer previsões seguras sobre as eleições de outubro. Há uma euforia pró-Dilma com as últimas pesquisas que a põem na frente a ponto de se falar numa vitória no primeiro turno. Instituições e mídia conservadoras inclinam-se por uma vitória daquela que seria a primeira mulher a governar o Brasil: é o que se lê em documentos tão diferentes quanto um relatório interno do Citibank e uma reportagem da vetusta The Economist.
Mas tudo isso são projeções. De qualquer modo, essa nova paisagem mostra que um resultado favorável a Dilma poderia detonar de vez uma velha direita brasileira, anacrônica, aferrada a seu “direito” de arrogar-se única representante dos “interesses nacionais” e a desqualificar a “massa não cheirosa brasileira” como protagonista política, que é o que, no momento, a candidatura Serra representa.Isso abriria espaço para um pensamento conservador mais “up to date” (para usar um dos termos que eles gostam), tanto no plano externo quanto no plano interno. Poderia gestar um pensamento mais apto a conviver com a democracia como um fator positivo da paisagem, e não algo a ser contornado (já que hoje é difícil ser suprimido como foi em 1964) por manipulações grosseiras como essa de criar um jingle que só fala do atual presidente e uma favela virtual para popularizar seu candidato, que a própria The Economist define como “tedioso na maior parte do tempo, exceto ao sorrir, quando parece assustador”.
Quando olhamos o número de eleitores brasileiros no exterior, que não chega a 10% dos residentes, ele nos parece pequeno. Entretanto ele é fator de ânimo e também índice dessa percepção de que o Brasil vive um momento de consolidação democrática. Em 2000, havia 43.390 eleitores brasileiros registrados no exterior, número que passou para 86 mil em 2006, 105 mil em 2007 e agora passou das duas centenas de milhar. Isso atesta o crescente interesse dos brasileiros fora do Brasil pelas eleições na sua pátria, e sua politização, bem como, de certo modo, a importância que o papel relevante que o Brasil adquiriu na cena internacional tem para o pleito.Um dado curioso: a grande maioria (3/4) desses eleitores – pelo menos na Europa – são mulheres. Isso se reflete na organização – ainda incipiente das campanhas. Por exemplo: no dia 11 de setembro haverá o lançamento do primeiro comitê pró-Dilma na Europa, com um forte acento feminino. Será na municipalidade de Dortmund-Hörde, no oeste do país, na Igreja Evangélica Noites de Glória, uma das 40 que existem na Alemanha dedicadas à imigrantes brasileiros, com participação também de alguns portugueses. Vai ter feijoada, ao preço não obrigatório de 10 euros, e depoimentos de grupos de várias cidades da Alemanha, entre elas, Berlim. Será, se não houver outro comitê inaugurado antes, o segundo comitê pró-Dilma no mundo, tendo o primeiro sido aberto no estado de Massachussets, nos Estados Unidos, ainda neste mês de agosto.
Outro dado curioso, este, intrigante. Em 2006 o Ministério de Relações Exteriores estimava em 60 mil o número de brasileiros residentes na Alemanha. Entretanto, o Serviço de Estrangeiros desse país tinha o registro de apenas 24 mil. Qual a razão? Clandestinidade? Pode ser. Estudantes (em número elevado) que não se registram porque são “residentes temporários”? Também pode ser. Ficam as perguntas. Em 2006 a votação no exterior, segundo o TER, foi: 1º turno: 17.513 para Alckmin; 15.551 para Lula; 2º turno: 20.912 para Alckmin, 17.948 para Lula. Isso mostra um baixo comparecimento, menos de 50%. Fica a conferir qual será a evolução desses números em 2010.
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