quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Dilma não é Lula de saias. Retrospectivas e perspectivas II

Reproduzidos do Amalgama (http://www.amalgama.blog.br/)

O futuro do lulismo após as eleições

-- Dilma, Temer e Lula (foto: AE) --
por André Egg 
Muita gente anda falando em lulismo. Na reta final das eleições, estamos na iminência de uma vitória de Dilma Rousseff no primeiro turno, principalmente devido ao apoio do presidente. Também existe a perspectiva de eleição de um senado e uma câmera de forte maioria dos grupos políticos aliados a Lula.
Daí se fala (por exemplo no blog do Rudá Ricci) no perigo de um “lulismo” superpoderoso, quase totalitarista.
Balela.
Primeiro, é preciso ter em mente que não haverá lulismo sem Lula. Poderíamos falar em um lulismo totalitarizante se o presidente tivesse insistido em emplacar um terceiro mandato (se tivesse eleições ele ganharia fácil). Não foi o que ocorreu. Como FHC, Lula é um democrata, que respeita muito a estabilidade institucional conseguida a muito custo no Brasil.
Aliás, não custa lembrar, Lula será o primeiro presidente eleito em condições insuspeitas, que terminará o(s) mandato(s) obtidos nas urnas entregando o cargo a um sucessor escolhido em eleições limpas. Dizem que esta é a maior prova de democratização de um país.
O quê, você não está acreditando na minha afirmação? Bem, FHC também realizou essa façanha, mas o detalhe é que ele mudou as regras, acrescentando uma possibilidade de reeleição que não existia quando ele foi eleito. Outros presidentes na história? Antes de 1930 todas as eleições eram muito pouco “livres” ou “honestas”. Em 1930 a posse do presidente eleito foi abortada por uma revolução, e Getúlio ficou no poder até 1945. As eleições deste ano foram executadas sob intervenção de um golpe militar, sem normalidade constitucional. O eleito – Marechal Dutra, era um prócer filo-nazista, e seu governo de “abertura” foi um dos mais violentos e autoritários da história. Em 1950 Getúlio se elegeu de forma livre, mas cometeu suicídio antes do fim do mandato. Em 1955 Juscelino foi eleito, mas pairava uma incerteza jurídica sobre a validade de sua vitória sem maioria absoluta dos votos. O impasse só foi resolvido com uma viagem do eleito aos EUA, gesto que praticamente inviabilizou as tentativas de impedir sua posse. Eleito em 1960, Jânio governou somente 9 meses antes de renunciar. Em 1964 veio o golpe militar. O primeiro presidente eleito depois disso foi Collor em 1989, que não concluiu o mandato.
De modo que a democracia institucional está se consolidando no Brasil somente agora, no século XXI.
Mas, voltando ao tema, a não insistência de Lula em um terceiro mandato significa que o lulismo acaba este ano.
Lula terá influência em um governo Dilma? Talvez sim. Ele será uma eminência parda? Um homem a governar dos bastidores? Um garantidor da estabilidade política do novo governo? Duvido.
Dilma terá uma aliança política sólida no Congresso. Terá boa base aliada nos governos estaduais. Não é uma pessoa politicamente frágil. Pelo perfil dela, acho mais provável que ela tire Lula de cena muito rápido. Ele passará para a história como o maior presidente do Brasil. Poderá exercer diversas funções, quiçá se tornar uma liderança de apelo mundial como alguns ex-presidentes dos EUA (notadamente Jimmy Carter e Bill Clinton). No Brasil ele terá menos peso político do que hoje tem FHC.
Porque FHC continuou sendo, após deixar a presidência, o principal quadro do PSDB, o segundo maior partido brasileiro. Sim, porque o PMDB não conta – incha e desincha conforme conveniências de momento. Lula não será o principal quadro do PT. Sua força no partido derivava da condição de ser a figura de maior simbolismo político, de maior potencial como candidato futuro. Essa condição ele já perdeu. Sua prevalência sobre o partido tornou-se aguda quando ele esteve na presidência: tinha a caneta na mão, nomeava, fazia operações “cirúrgicas”, reforçando ou afastando quadros partidários do governo, conforme lhe convinha a própria sobrevivência política.
Agora, a prerrogativa estará com Dilma. Sua capacidade de governar é muito maior que a do próprio Lula. Enfrentará resistências muito menores que ele teve que enfrentar. Assumirá o país numa situação muito mais favorável. Governará por 8 anos e fará a maior transição política da nossa história. Quando estivermos aqui discutindo as condições políticas de sua sucessão em 2018, os partidos e os líderes políticos que tiveram importância no ocaso do regime militar e nas disputas da era FHC-Lula já terão se tornado coisa do passado. O Brasil estará num novo patamar.
E Lula terá sido vítima do próprio sucesso.

André Egg
Músico e historiador, professor da Faculdade de Artes do Paraná, ex-professor da Faculdade Teológica Batista do Paraná, doutor em História Social pela USP.

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